sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

A Arbitragem em Matéria Administrativa


Não existe uma norma de permissão geral de arbitragem em matéria administrativa em Portugal. De acordo com o artigo 1.º/5 da Lei da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro, doravante LAV), o Estado e as pessoas colectivas de direito público podem celebrar convenções de arbitragem, se estiverem especialmente autorizadas por lei ou se tais convenções tiverem por objecto litígios de direito privado.
Ora, nos litígios respeitantes a relações de direito privado, em que as entidades públicas figuram como se fossem sujeitos privados, trata-se de matérias que não pertencem à jurisdição dos tribunais administrativos mas dos tribunais judiciais, sendo, então, aplicáveis as regras de natureza processual que também se aplicam aos privados, incluindo as que, por força da LAV disciplinam a arbitragem, permitindo-a amplamente. Contudo, como refere o Professor Mário Aroso de Almeida, o sentido do artigo 1.º/4 da LAV parece ser o de delimitar o alcance da solução consagrada no seu artigo 1.º/1 que determina que qualquer litígio respeitante a interesses de natureza patrimonial pode ser cometido à arbitragem desde que não esteja submetido exclusivamente aos tribunais do Estado ou à arbitragem necessária, esclarecendo que a cláusula geral de arbitralidade aí enunciada apenas tem em vista a arbitragem nos termos das relações jurídicas de direito privado.
Quanto a arbitragem de litígios que envolvam entidades públicas, não dizendo respeito a relações de direito privado, já foi matéria regulada no E.T.A.F. que determinava que eram admitidos tribunais arbitrais no domínio do contencioso administrativo contratual e de responsabilidade civil por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo o contencioso das acções de regresso, sendo um ponto pacífico entre a doutrina já que, no âmbito desse contencioso, apenas se discutem questões que não envolvem o exercício de poderes de autoridade, sendo a função do juiz/árbitro, correspondente à dos juízes dos tribunais judiciais.
Actualmente, a matéria relativa à arbitragem encontra-se regulada no Título IX, artigos 180.º a 187.º do CPTA. Desta forma, existe uma ”lei especial” para o efeito do disposto no artigo 1.º/4 da LAV a permitir, em certos termos, o recurso a arbitragem.
Com efeito, salvaguardando ainda outras hipóteses previstas em lei especial, o CPTA reserva a possibilidade de constituição de um tribunal arbitral para dirimir conflitos que respeitem a contratos, incluindo a apreciação de actos administrativos relativos à respectiva execução (artigo 180.º/1 alínea a); responsabilidade civil extracontratual, incluindo a efectivação do direito de regresso (artigo 180.º/1 alínea b) mas excluindo-se a responsabilidade decorrente de actos praticados no exercício da função política e legislativa ou jurisdicional (artigo 185.º); actos administrativos que possam ser revogados sem fundamento na sua invalidade, nos termos da lei substantiva, (artigo 180.º/1 alínea c); e litígios emergentes de relações jurídicas de emprego público, quando não estejam em causa direitos indisponíveis e quando não resultem de acidente de trabalho ou de doença profissional (artigo 180.º/1 alínea d).
A introdução das alíneas a) e c) do artigo 180.º foi inovadora já que o artigo 1.º/1 da antiga LAV (Lei 31/86, de 29 de Agosto) proibia a apreciação pelo tribunal arbitral de litígios que respeitassem a direitos indisponíveis, isto é, direitos em relação aos quais não releva a vontade das partes, podendo haver litígios, à partida enquadráveis nas alíneas a) a c) do n.º 1 do art. 180.º do CPTA, que envolvessem direitos dessa natureza. Contudo, com a alteração da LAV em 2011, parece que deixou de se colocar tal problema tão debatido na doutrina e jurisprudência.
Refira-se ainda que, em qualquer das situações descritas no n.º 1 do art. 180.º, caso existam contra-interessados, o litígio não pode ser dirimido por um tribunal arbitral, a não ser que aqueles aceitem tal compromisso (artigo 180.º/2), que se justifica pela relevância da tutela dos interesses dos contra-interessados no âmbito das relações jurídico-administrativas (os quais deverão demandados por aplicação analógica do art. 57.º do CPTA; desta forma, havendo aceitação do compromisso, a decisão proferida faz caso julgado em relação a todos os intervenientes, em concretização do princípio da economia processual) constituindo uma evolução legislativa já que antigamente apenas poderiam ser dirimidos pelos tribunais estaduais os contratos que envolvessem terceiros, ressalva importante dado que se assim não fosse a arbitragem poderia ser utilizada para se subtrair a intervenção no litigio dos eventuais contra-interessados.
Iniciativa da celebração do compromisso arbitral tanto poderá pertencer a quem seja parte na relação contratual (Administração Pública ou o seu co-contratante privado) como a um terceiro, uma vez que o artigo 40.º/2 estende a terceiros a legitimidade para deduzir pedidos relativos à validade e execução dos contratos da admistrição, sem prejuízo, é claro, do disposto no artigo 180.º/2 a respeito dos contra-interessados.
À arbitragem dos litígios emergentes de relações jurídico-administrativas é aplicável, com pequenas adaptações o regime geral da LAV que regula a arbitragem voluntária relativamente a qualquer tipo de litígios (artigo 181.º). Assim, de acordo com o artigo 1.º/1 da LAV os litígios são cometidos à decisão de árbitros mediante convenção de arbitragem, que pode consubstanciar uma cláusula compromissória mediante a qual as partes aceitam submeter a tribunal arbitral os eventuais litígios que possam surgir no âmbito dessa relação, ou num compromisso arbitral que é celebrado na presença de um litígio actual.
O CPTA          no seu artigo 182.º sob a epígrafe direito à outorga de compromisso arbitral dispõe que o interessado que pretenda recorrer à arbitragem no âmbito dos litígios de natureza jurídico-administrativa, pode exigir da administração a celebração de compromisso arbitral, nos termos da lei. Coloca-se a questão de saber se o poder conferido naquele preceito representa um direito potestativo ou não, que permita ao interessado, pela simples declaração dirigida à Administração Pública, constitui-la no dever de celebrar um compromisso arbitral. Segundo alguns autores, como José Luís Esquível, estamos perante um direito potestativo, por do seu exercício unilateral resultar a alteração da ordem jurídica. Para outros, como Mário Aroso de Almeida, não se pode ainda afirmar um direito à outorga do compromisso arbitral, ou pelo menos este não é ainda exercitável, uma vez que o próprio preceito, quando remete para «os termos da lei», faz depender a existência de tal direito de lei que especificamente venha regular os pressupostos da sua constituição. Há ainda quem rejeite a ideia de um direito potestativo, como João Caupers já que a lei não prevê efeitos jurídicos automáticos para a recusa de celebração do compromisso arbitral.
Desta forma, o artigo 183.º determina que a apresentação de requerimento com base no direito à outorga de compromisso arbitral determina a suspensão dos prazos para recorrer à jurisdição administrativa. João Caupers vê aqui uma admissão implícita do legislador a que o requerimento possa não ser despachado favoravelmente. As condições de exercício do direito à outorga de compromisso arbitral constam do artigo 184.º, enquanto que o artigo 187.º determina os termos em que pode ser autorizada a instalação de centros de arbitragem.

Processos Urgentes – As Intimações


O CPTA regula no seu título IV os processos urgentes com base na ideia de que existem determinadas questões que devem receber uma resolução judicial num tempo relativamente curto e às quais não se adequam providências cautelares que regulam provisoriamente a situação em termos de poder assegurar a utilidade da sentença produzida em tempo normal. Neste âmbito figuram as impugnações urgentes  (impugnações relativas a eleições administrativas e impugnações de contencioso pré-contratual) e as intimações nos artigos 97.º e seguintes do CPTA.
As Intimações são processos urgentes de condenação que visam a imposição judicial à Administração Pública de adopção de comportamentos e prática de actos administrativos. Existem dois tipos de intimações configurados no CPTA que pela necessidade de resolução urgente da situação, exigem uma tramitação acelerada: A intimação para prestação de informações, consulta de documentos e passagem de certidões (artigos 104.º a 108.º) e a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias (artigos 109.º a 111.º).

O processo especial urgente de inti­ma­ção para a pres­­tação de informações, con­sulta de pro­ces­sos ou pas­sa­gem de cer­tidões é uma forma especial de processo dirigida a assegurar uma tutela específica, em condições de maior celeridade, ao direito à informação procedimental, fundado nos artigos 61º a 64º do CPA, e ao di­reito à informação extra-pro­ce­di­mental, con­sa­gra­do no artigo 268º, nº 2, da CRP. Logo, a utilização deste meio pressupõe o incumprimento pela Adminsitração Pública do dever de informar ou notificar, valendo, por isso, a exigência do pedido anterior do interessado como pressuposto processual. Assim, a utilização desta forma especial de processo urgente pressupõe  que o interessado tenha apresentado à Administração um pedido dirigido a obter a consulta de um processo, a passagem de uma certidão ou a prestação de informações e se tenha visto confrontado com o decurso do prazo legalmente estabelecido, sem que a entidade requerida tenha dado satisfação à pretensão, ou com indeferimento do pedido, ou apenas com a satisfa­ção parcial do pedido. Desta forma, este processo especial tanto pode ser utilizado quando a Administração te­nha permanecido omissa, como quando ela tenha respondido à pretensão do interessado.
O artigo 105.º determina que o prazo para o interessado poder deduzir o pedido de intimação é de 20 dias, começando a correr, consoante os casos, com o termo do prazo de que a Adminis­tra­ção dispunha para satisfazer o pedido ou com a data da notificação do acto de indeferimento expresso ou de deferimento parcial. O prazo para a Administração facultar a consulta do processo, emitir a certidão ou prestar as informações é, entre­tanto, de dez dias (artigos 61º, n.º 3, 63, n.º 1, e 71º, n.º 1, do CPA) e conta-se em dias úteis, nos termos previstos no artigo 72º do CPA.
A intimação pode ser pedida pelos titulares dos direitos de informação ou, na hipótese de utilização para efeitos de impugnação judicial, por todos os que tenham legitimidade para usar os meios impugnatórios (artigo 104.º nº 2). Já a legitimidade passiva parece caber à pessoa colectiva a que pertence o órgão em falta (artigo 10.º/2). Contudo, o artigo 107.º refere-se à autoridade e não entidade, portanto, como refere o Professor Vasco Pereira da Silva, a não haver aqui um regime especial de legitimidade, o requerente deverá identificar o órgão responsável.
Com a resposta da autoridade no prazo de 10 dias é imediata a decisão do juiz, em regra, não havendo necessidade de outras diligências (artigo 107.º). A decisão é condenatória e o juiz deve fixar prazo de 10 dias para cumprimento da intimação, podendo haver possibilidade de sanção pecuniária compulsória, sem prejuízo da responsabilidade do órgão ou titular (artigo 108.º).

A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é regulada nos artigos 109º a 111º do CPTA e é um processo especial urgente que pode ser requerido quan­do a cé­le­re emissão de uma de­ci­são de mé­ri­to que im­­­po­­nha à Administração a adopção de uma con­duta positiva ou ne­ga­tiva se revele in­dis­pen­sá­vel pa­ra as­se­gu­rar o exercício, em tem­po útil, de um di­rei­to, liberdade ou garantia, por não ser pos­­sí­vel ou su­fi­ciente, nas cir­­cuns­tân­cias do caso, o de­cre­ta­­mento provisório de uma pro­­vi­dên­­cia cau­­te­lar, segundo o disposto no artigo 131º” (artigo 109º, nº 1). A utilização desta acção deve por isso mesmo, limitar-se às situações em que esteja em causa directa e imediatamente o exercício do próprio direito, liberdade ou garantia ou direito análogo.
Este meio, criado na sequência do imperativo constitucional reconhece a importância de uma protecção acrescida dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos que se justifica pela especial ligação destes direitos à dignidade da pessoa humana e pela consciência do perigo acrescido da respectiva lesão.
Deste modo, exige-se a urgência da decisão para evitar a lesão do direito, pressupondo que o pedido se refira à imposição de uma conduta positiva ou negativa à Administração Pública, sendo que a lei exige que não seja suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar.
A legitimidade pertence aos titulares dos direitos, liberdades ou garantias, embora se possa admitir, como refere o Professor Vasco Pereira da Silva, acção popular desde que tal respeite a disponibilidade legítima dos direitos pelos titulares mas o pedido de intimação pode ainda ser dirigido contra concessionários ou contra particulares, mesmo que não disponham de poderes públicos desde que usada para suprir a omissão administrativa das providências adequadas à prevenção ou repressão das condutas lesivas de direitos de outrem. O conteúdo do pedido será a condenação na adopção de uma conduta pela Administração (artigo. 109.º/1 e 3).
A lei prevê vários andamentos possíveis para este processo consoante se considerem processos simples e de urgência normal (artigo 110.º/1 e 2), processos complexos de urgência normal (artigo 110.º nº 3) ou situações de especial urgência (artigo 111º), sendo que nestas situações o juiz pode optar por uma tramitação acelerada, com encurtamento pelo juiz do prazo de resposta do requerido, ou então por uma tramitação simplificada, realizando audiência oral de julgamento, para decisão no prazo de 48 horas. A qualificação como urgente é a que for adequada ao caso concreto, tendo o juiz uma prerrogativa de avaliação.

Situações de Legitimidade Plural


A pluralidade de partes no processo ocorre quando vários autores litigam com um só demandado ou quando um só autore acciona vários demandados. O CPTA ad­mi­te nos mais amplos termos a existência de situações de plu­ra­li­da­de de partes, seja sob a for­ma da coligação, seja sob a forma do litisconsórcio, neces­sá­rio ou voluntário.
O CPTA é, na verdade, bastante claro no que toca à definição do regime da coligação que se define por uma situação de pluralidade de partes e de relações jurídicas, sendo cada pedido pedido formulado por cada autor contra cada um dos réus, permitindo num único processo vários pedidos diferentes com fundamentos diferentes, con­­­sagrado no artigo 12º, com âmbito geral para todo o contencioso ad­mi­nis­trativo.
Já o litisconsórcio pressupõe a co-titularidade da relação jurídica entre os litisconsortes, ou seja, a existência de uma única relação material, sendo o pedido formulado por todos os autores contra o réu ou contra todos os réus pelo autor.
Resulta da natureza das coisas e da aplicabilidade supletiva do CPC a pos­sibilidade da existência de situações de li­tis­con­sór­­cio necessário sempre que se pre­en­cham os requisitos genericamente previstos no arti­go 28º do CPC, como também é suple­ti­va­mente aplicável ao contencioso administrativo o regime do CPC no que se refere ao litis­con­­sórcio voluntário. Ao referir-se genericamente à possibilidade de particulares serem de­man­da­dos “no âmbito de relações jurídico-administrativas que os envolvam com entidades pú­bli­cas ou com outros particulares”, o artigo 10º, nº 7, tem, aliás, nesse sentido, o alcance de admitir, nos mais amplos termos, a possibilidade da constituição de situa­ções de litisconsórcio vo­lun­­tário passivo, quando se dis­cu­tam relações jurídicas que di­­gam simultaneamente respeito a entidades públicas e a en­ti­da­des privadas, abrindo, desse modo, a porta à aplicação supletiva do disposto nos arti­gos 27º e 31º-B do CPC.

O artigo 10º, nº 1, tem, entretanto, o cuidado de fazer referência à eventual ne­cessidade de a acção não ser apenas proposta “contra a outra parte na relação ma­te­rial controvertida”, mas também, “quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades ti­tu­­lares de inte­res­ses contrapostos aos do autor”. A referência dirige-se claramente aos cha­ma­dos contra-in­te­res­sados, categoria que o CPTA expressamente prevê nos artigos 57º e 68º, nº 2, e que se pode definir como cor­res­­­pondendo às pessoas cuja esfera jurídica pode ser directamente afectada pela decisão a proferir no processo. Não é por acaso que o Código faz referência específica aos contra-interessados nos arti­gos 57º e 68º, nº 2 a propósito da impugnação de actos administrativos e da con­­denação à prática desse tipo de actos. Trata-se, na verdade, de domínios em que a acção é pro­posta contra a Ad­mi­nis­tra­ção, contra a entidade que praticou ou que omitiu ou re­cusou o acto administrativo, mas em que há sujeitos que também são partes no litígio, na medida em que os seus interesses coincidem com os da Administração e po­dem ser directamente afectados na sua consistência jurídica com a procedência da acção. Neste ponto reside a especificidade da situação, que justifica a sua autonomização em relação à previsão genérica, de âmbito mais alargado do que o artigo 10º, nº 7.
As relações jurídicas relacionadas com o exercício de poderes de au­­­to­­ridade por parte da Administração são, na verdade, frequentemente complexas, en­vol­vendo um con­­­­­­­­junto alargado de pessoas cujos interesses são afectados pela actua­ção da Administração. Se, num caso concreto, há um in­te­­­ressado que pre­ten­de a anu­­lação de um acto administrativo que considera ilegal ou a prática de um acto administrativo que considera devido, é nor­mal que também exis­tam in­te­­res­sados que, sendo beneficiários do acto ilegal ou podendo ser afectados pelo acto devido, tenham in­te­resse em que ele não seja anu­lado e, pelo contrário, se mantenha na ordem jurí­di­ca, ou que ele não seja praticado e, portanto, tudo se mantenha como está.
É certo que o objecto des­tes pro­ces­sos não se define por re­fe­rên­cia às situações sub­jectivas dos contra-interessados, titulares de interesses contrapostos aos do autor, mas à po­si­ção em que a Ad­ministração se en­con­tra colo­ca­da, no quadro do exercício dos seus poderes de au­to­ri­dade. Com efeito, a discussão em juízo centra-se na questão de saber se se anula ou não o acto ad­mi­nis­­tra­tivo, se se condena ou não a Administração a praticar um acto ad­mi­nis­tra­tivo mas essa cir­cunstância não retira aos contra-interessados a sua qua­lidade de verdadeiras par­­­tes na relação jurídica e no litígio, para o efeito de deverem ser demandadas em juí­zo. É o que resulta do artigo 10º, nº 1 “in fine”, que re­co­nhe­­ce aos con­tra-in­­­teressados o estatuto de ver­da­deiras partes de­man­­da­das, em si­tuação de litis­con­sór­cio necessário passivo e unitário com a enti­da­de pública, com to­das as con­­sequências que daí advêm.
Por este motivo, tem o CPTA o cuidado de, tanto no artigo 57º, como no artigo 68º, nº 2, densificar o conceito de contra-interessados e, em particular, o cuidado de o cir­cuns­cre­ver às pessoas “que possam ser identificadas em função da relação material em causa ou dos documentos contidos no processo administrativo”. Está aqui presente o propósito de ob­jectivizar a operação de delimitação do universo dos “titulares de interesses con­tra­pos­tos aos do autor” que devem ser demandados no processo (artigo 10º, nº 1), atendendo às con­­sequências gravosas que resultam da sua falta de citação: ile­gitimidade passiva que obs­ta ao conhecimento da causa (cfr. artigos 78º, nº 2, alínea f), 81º, nº 1, e 89º, nº 1, alí­­nea f)) e inoponibilidade da decisão judicial que porventura venha a ser proferida à re­velia dos contra-interessados (cfr. artigo 155º, nº 2).

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Sentenças substitutivas

De: Rita Robalo de Almeida
nº18381


Existem no contencioso administrativo situações singulares por comparação aos tipos do processo civil, nomeadamente a hipótese das sentenças substitutivas de ato administrativo, como previstas nos arts. 3.º/3, 157.º/4, 164.º/4/c), 167.º/6 e 179.º/5 do CPTA.

Esta situação encontra-se praticamente limitada à execução das sentenças, só se verificando para além disso no art. 109.º/3, relativo à intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias.
A questão que aqui se coloca é se haverá uma violação do principio da separação de poderes, nos termos do art.3º, 1 CPTA, por parte do Tribunal Administrativo quando este profere as suas decisões.
A Administração é substituída pelo Tribunal Administrativo, praticando atos em ãmbitos sobre os quais a competência em primeiro lugar é da Administração e não do Tribunal Administrativo, sendo assim o ato substitutivo o suprimento da omissão da prática de um ato administrativo ou a sua revogação. Tal substituição deve ser autorizada pela ordem jurídica ao órgão que visa substituir o primeiro. No ver do Prof. Vieira de Andrade, as sentenças substitutivas são sentenças exequíveis por si mesmas, pois os seus efeitos são produzidos diretamente.
A substituição não advém de iniciativa do órgão jurisdicional emitente da sentença substitutiva, visto tratar-se de um modo dos Tribunais Administrativos garantirem a execução das suas próprias sentenças, cabendo, isso sim, ao interessado (art. 176.º/1 CPTA) – é sempre uma substituição provocada.
Com este poder de se substituir à Administração o Tribunal entraria “pelos domínios da reintegração da ordem jurídica violada”, fazendo, ele próprio, algo que a Administração não fizera, ou não quisera fazer.
Quanto à substituição integrativa, no entendimento do Prof. Paulo Otero o órgão substituído não vê, na situação referida, atacada a sua autotutela pois podia ter agido mas não o fez por sua livre vontade. Dito isto, a substituição é feita só na medida da necessidade de reintegrar a legalidade violada por omissão, impondo-se o Direito como ponto fulcral que determina o juízo que é feito, não se ultrapassando os limites materiais da função jurisdicional.
Quanto à substituição revogatória, para o Dr. Ricardo Branco apenas pode ser transferida para o Contencioso Administrativo se só se tiver como objectivo a reintegração da ordem jurídica violada, eliminando a infração que foi cometida através da prática de um ato ilegal.
Outra questão é a de o Dr. Duarte Amorim Pereira dizer que o Tribunal pode substituir a Administração aquando da realização de prestações de facto fungível, quando a execução não for cumprida de modo voluntário pela entidade administrativa espontaneamente ou dentro do prazo de oposição.
No caso de violação da lei por omissão de ato administrativo pela Administração, o Tribunal, dentro dos limites da sua função, só vai intervir reintegrando este, através de sentença, a juridicidade depois da primeira ser condenada duas vezes na reintegração da legalidade: será necessário que a Administração não cumpra cumpra, primeiro, a sentença condenatória e de seguida ignore a pronúncia declarativa do art. 179.º/1 CPTA uma vez que, como nos diz o Prof. M. Aroso de Almeida, a fase declarativa no processo de execução de sentenças acaba com uma decisão judicial. O poder de substituição judicial da Administração justifica-se,em primeiro lugar, em ordem a garantir o princípio de tutela jurisdicional efectiva, que exige que o tribunal, embora não assuma a posição constitucional e institucional da Administração, decida em lugar da própria Administração, fazendo o que esta devia ter feito e não fez (isto é, executando em seu lugar a decisão exequenda), de maneira a satisfazer os direitos e interesses legítimos do cidadão interessado.

De: Rita Robalo de Almeida
nº18381

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo: 05501/12

Secção: CT-2º JUÍZO


Data do Acordão: 11-12-2012

Relator: EUGÉNIO SEQUEIRA

Descritores: ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL.
IRC.
TRANSMISSÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS.
RAZÕES ECONÓMICAS VÁLIDAS.
PLANO ESPECÍFICO DE DEDUÇÃO.

Sumário: 1.A norma do art.º 69.º da CIRC, na redacção do art.º 221/2001, de 7 de Agosto, impõe como requisito para o deferimento da transmissão dos prejuízos fiscais, no caso de fusão por incorporação, que a operação seja realizada por razões económicas válidas;

2. O preenchimento deste estalão legal constitui matéria de discricionariedade técnica por banda AT, com uma ampla margem de livre apreciação, o qual não pode ser fiscalizado pelos tribunais, salvo erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal;

3. O plano específico de dedução dos prejuízos fiscais da sociedade incorporada depois da sua fusão na incorporante, no caso de deferimento, pode ser ajustado pela AT dentro do período legalmente devido, quanto aos respectivos limites dentro de cada exercício.






Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. C…. ………………………………………, CRL, (doravante, C………… ou autora), identificada nos autos, veio deduzir a presente acção administrativa especial contra o Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, tendo em vista obter a anulação do seu despacho de 8-1-2007 (despacho n.º 27/2007), proferido em delegação de competências, que lhe indeferiu o pedido de dedução de prejuízos fiscais por si apresentado em relação à incorporada CC…………………., e a entidade demandada condenada na prática do acto de deferimento expresso.


Tal acção foi interposta no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria o qual, após vicissitudes diversas, veio a declarar este Tribunal incompetente em razão da hierarquia (despacho de fls 474 a 476), tendo em conta a categoria do autor do acto, tendo os autos vindo a ser remetidos a este TCAS, onde prosseguiu a sua ulterior tramitação, com vista à Exma RMP e colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


Naquele TAF de Leiria, foi citada a entidade demandada, tendo a mesma vindo contestar e juntar o processo administrativo.


Neste mesmo TAF de Leiria, foi proferido o despacho de fls 374 dos autos, que decidiu da desnecessidade da produção de quaisquer outras provas, dele tendo sido interposto recurso para o STA, mas que foi não admitido pelo despacho de fls 404, sobre o qual nenhuma reacção suscitou junto das partes processuais.


No despacho supra, foram ainda as partes notificadas para alegarem por escrito, cujas conclusões na íntegra se reproduzem:


Da autora:
1. O pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais deduzido pela Autora, no âmbito da operação de fusão com a CC……………., respeitou todas as exigências legais e foi devidamente fundamentando, mormente, em face dos pressupostos previstos no n.º 2 do art. 69.º do CIRC.
2. Nos termos do art. 69.º do CIRC incumbe ao Ministro das Finanças decidir dos pedidos dos contribuintes para concessão do benefício ali previsto, indicando o n.º 2 que, para tal, a fusão deve fundar-se em razões económicas válidas e deve estar inserida numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva ­verificados tais pressupostos a lei incumbe a Administração no dever de decidir favoravelmente o pedido do contribuinte.
3. Conforme dispõe o Acórdão do STA de 05.07.06, proferido no recurso n.º 142/06, "razões económicas válidas" e "inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo Prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, "são conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe à Administração e que, ao contrário do poder discricionário verdadeiro e próprio, como poder de eleger uma de entre várias soluções igualmente válidas, só admitem uma solução justa no caso concreto".
4. Em face dos autos, é manifesta a existência de uma motivação económica válida da fusão em apreço, bem como, a sua inserção numa estratégia de redimensionamento e de reestruturação das entidades envolvidas, com claros efeitos positivos na estrutura produtiva.
5. Estes conceitos indeterminados de cujo preenchimento a lei faz depender a concessão do beneficio, segundo dispõe o Acórdão do TCA (Sul), de 01.02.05 (processo n.º 25/04), "devem ser preenchidos em concordância com o art. 11.º da Directiva n.º 90/434CEE do Conselho, de 23.07.1990, que dispõe sobre o regime fiscal comum, de modo a evitar a tributação das fusões, no sentido de que tais operações devem ir além da procura de um benefício puramente fiscal como a compensação horizontal de perdas, nos termos interpretados no acórdão C-28/95 do Tribunal de Justiça, de 17.07.1997".
6. In casu, muito para além do aproveitamento do potencial benefício fiscal atribuído por lei, o que, de facto, se visou com a fusão foi justamente a racionalização dos recursos existentes, lançando-se mão para o efeito do meio reconhecidamente mais válido para atingir esse fim - a fusão.
7. Em face da dissonância entre o disposto no art. 69.º do CIRC e a interpretação da Administração fiscal, o Despacho que indefere a pretensão da Autora é manifestamente ilegal, por violação de lei, por erro manifesto na interpretação de conceitos legais relativamente indeterminados e por desvio de poder, devendo ser anulado nos termos do art. 135.º do CPA.
8. O acto sub judice extravasa a letra e a ratio do n.º 2 do art. 69.º do CIRC, consubstanciando uma ilegalidade congénita do mesmo.
9. Estamos pois, perante o que a jurisprudência (vide, os acórdãos do STA, de 02.02.88, 10.07.86, 09.06.94 e 17.04.80, proferidos, respectivamente, nos recursos 021666, 020496, 028382, e 013565) denomina por erro manifesto na apreciação dos factos e na interpretação de conceitos legais relativamente indeterminados, erro esse que constitui vício de violação de lei, sindicável por esse Tribunal e susceptível de determinar a anulação do acto em crise.
10. O acto de indeferimento do pedido formulado pela Autora consubstancia um erro grosseiro de interpretação e uma manifesta desadequação ao escopo do art. 69.º do CIRC, bem como, da mens legis que o precede.
11. Invoca ainda a Administração fiscal que, ". . .a aplicação do plano especifico de dedução dos prejuízos fiscais, a que alude o n.º4 do art. 69.º do CIRC (determinado pelo Despacho n° 79/2005-XVII, de 2005/04/15, de S. Exa o SEAF), não iria permitir que a entidade incorporante deduzisse os prejuízos da entidade incorporada".
12. Como o poder decisório da Administração se esgota aqui na densificação dos requisitos do n.º 2 do art. 69.º, tal posição representa a criação de um verdadeiro critério decisório ex novo, fora do esquema regular de criação de normas legais impositivas, em violação do princípio da legalidade.
13. A limitação imposta pela Despacho n° 79/2005-XVII, do SEAF, cria uma efectiva e ilegal restrição do direito à dedução, violando abertamente os limites legalmente impostos no art. 69° do CIRC.
14. Tal viola manifestamente o princípio da legalidade, expresso no art. 103.º da CRP e no art. 8.º da LGT, bem como o princípio da tributação pelo rendimento real das empresas, vertido no n.º 2 do art. 104.º da CRP.
15. As circulares não são fonte de direito. Segundo SOARES MARTINEZ “não têm por destinatários os particulares, os cidadãos, os contribuintes", nem vinculam “os Tribunais, que tratam de aplicar as leis fiscais sem qualquer dependência dos critérios adoptados pela Administração" (Direito Fiscal, Almedina, 1993, pag. 111).
16. Visto que o Despacho n° 79/2005 - XVII, do SEAF, publicitado pela Circular 7/2005, não é lei não pode, como tal, o seu conteúdo ser assumido como critério decisor a ponderar pela Administração fiscal.
17. Sempre seria de refutar a aplicação in casu da Circular 7/2005, porquanto, as entidades envolvidas são cooperativas e, objectivamente, aquele normativo está pensada e estruturados para aplicar às sociedades comerciais.
18. O critério da Administração fiscal para indeferir o pedido da Autora é claramente desfasado desta ponderação e culmina numa decisão mal que viola, de forma flagrante, a ratio do art. 69.º do CIRC, bem como, de todo os instituto que potencia a neutralidade das operações de fusão.

TERMOS EM QUE, E NOS DEMAIS DE DIREITO, DEVE A PRESENTE ACÇÃO SER TOTALMENTE PROCEDENTE POR PROVADA, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, NOMEADAMENTE A REVOGAÇAO DO ACTO DE INDEFERIMENTO EXPRESSO DO PEDIDO DE DEDUÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS DEDUZIDO PELA AUTORA E A CONSEUQUENTE CONDENAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO FISCAL À PRÁTICA DO DEFERIMENTO LEGALMENTE DEVIDO JUSTIÇA


Da entidade demandada:
I. A Entidade Ré reitera tudo o que ficou dito em sede de contestação, contudo, sempre se destaca, em suma, aquilo que entende ser mais relevante na decisão da presente Acção:
II. A Autora interpôs a presente acção administrativa especial contra o despacho n.º 27/2007-­XVII, de 08.01.2007, pugnando pela sua anulação por ilegalidade, na parte em que indeferiu o pedido de dedução de prejuízos fiscais nos termos do artigo 69.º do CIRC e pela condenação da Entidade Ré à prática de acto administrativo devido.
III. A Autora, não concorda com os fundamentos do acto ora impugnado, que no seu entender contrariam a letra e o espírito da lei, e argumenta que foi aplicada ilegalmente a Circular 7/2005 de 16 de Maio e que lhe foi coartado o seu "direito à dedução".
IV. Mas não tem a A. razão. Aliás, os seus argumentos são pouco consistentes, até contraditórios nada havendo a apontar à fundamentação do acto de indeferimento.
V. A Autora destaca o facto de a CC………………. se encontrar numa situação difícil e admite que a criação da nova estrutura foi motivada pelo facto de a actividade da estrutura existente no passado (referindo-se à CC………………) não ter corrido tão bem como se perspectivava.
VI. A Autora também admite que as limitações decorrentes do balanço e da desorganização da CC………………….. lhe vedaram a actividade de concessão de crédito não agrícola a não associados.
VII. Aliás, nos dias imediatamente anteriores à escritura de fusão, o património da CC………………….. registava um valor negativo (-€485.457).
VIII. E é inegável a grande desproporção entre o valor da sociedade incorporada e o da ora Autora.
IX. De acordo com os factos indicados, ficou assim, por esclarecer, o interesse económico da operação de incorporação da CC…………………., dado que esta sociedade representa uma sobrecarga tão elevada, com risco de não poder continuar a exercer a sua actividade normal, e apenas apresenta elevados prejuízos.
X. Refira-se o conteúdo do ponto 14 da Adenda à informação n.º 1439/2006 que destaca que, quaisquer efeitos positivos que se viessem a verificar após a fusão só poderiam ficar a dever­-se, exclusivamente à sociedade incorporante que se encontrava numa boa situação financeira e patrimonial.
XI. Da análise da fundamentação do acto, constante dos pareceres informações juntos no PA, nomeadamente a informação n.º 1439/2006 da Direcção de Serviços do IRC e a respectiva Adenda de 14/12/2006, resulta claramente indiciada a natureza fiscal da operação.
XII. Perante os factos referidos, a Administração Fiscal só podia concluir que o principal contributo da sociedade incorporada na operação de fusão se resume à transmissão de elevados prejuízos para a sociedade incorporante.
XIII. Contrariamente ao defendido pela Autora, não existe na presente situação um "direito à dedução".
XIV. O regime de reporte de prejuízos é um regime de excepção, tratando-se de um medida de afastamento excepcional do regime geral de intransmissibilidade dos prejuízos fiscais, consagrado no artigo 47.º do CIRC.
XV. Aliás, para que seja autorizada a dedução dos prejuízos fiscais da sociedade incorporada, é necessário ter em consideração os pressupostos e condições de aplicação do regime (cfr. art 69° do CIRC).
XVI. O artigo 69° do CIRC, contém conceitos indeterminados - como "razões económicas válidas" ou "se a fusão se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva" - o que dá à Administração fiscal uma margem de livre decisão, e a necessidade de ponderar, dentro dos limites da discricionariedade técnica, se por exemplo, existiram "razões económicas válidas" na operação de fusão para que seja autorizada a transmissão de prejuízo.
XVII. Assim, não se pode concluir que a A. tenha um verdadeiro "direito à dedução", como se se tratasse de um mero reconhecimento de um benefício, que estivesse dependente apenas da verificação de pressupostos sem a necessidade do preenchimento valorativo dos conceitos referidos. A ser assim, esta interpretação do artigo 69.º do CIRC seria completamente abusiva e ilegal.
XVIII. A própria jurisprudência, no Acórdão do STA de 07/05/2006, Rec. 0142/06, conclui que a Administração tem uma longa margem de apreciação relativamente a matéria de discricionariedade técnica. E o mesmo defende o Prof. Freitas do Amaral e o Prof. Casalta Nabais in. Direito Fiscal, 3. Edição, citados no referido Acórdão do STA.
XIX. Pelo que, não estamos perante o exercício de poderes vinculados, mas ao contrário é o próprio legislador que remete para a Administração a competência para fazer um juízo técnico, com uma larga margem de livre apreciação.
XX. Deste modo, se pode concluir que, face ao fim legal, outra não podia ter sido a decisão da Administração Fiscal, que não o indeferimento da requerida dedução de prejuízos.
XXI. Quanto à aplicabilidade da Circular 7/2005 de 16/5 que divulgou o Despacho n.º 79/2005-­XVII, de 16/04/05 do Sr. SEAF (articulados 150° a 164° da PI). Esclarece-se que no referido despacho, o Sr. SEAF sancionou a aplicação de critérios objectivos, para efeitos do exercício do poder conferido no n.º4 do artigo 69° CIRC, de modo a uniformizar as decisões.
XXII. As circulares são orientações genéricas que vinculam a Administração (art.º 68° n.º4 b) da LGT) e visam a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços (art.º 55° CPPT).
XXIII. Contesta-se também a interpretação que Autora faz do n.º 4 do artigo 69.º do CIRC pois não tem em conta que o n.º 4 do artigo referido, só é aplicável quando existe um despacho de autorização.
XXIV. Apenas nesses casos, é que a Administração Fiscal recorre às orientações da referida Circular, e a isso está vinculada;
XXV. De facto, o objectivo da circular, é o "de compatibilizar os interesses financeiros do Estado com o regime especial de neutralidade fiscal em que se integra o benefício da transmissibilidade dos prejuízos fiscais, por forma a que o exercício da faculdade prevista no n.º4 do artigo 69° do Código do IRC assente em critérios objectivos que permitam a uniformização das referidas decisões."
XXVI. Pelo que, não tem a A. razão ao dizer que "o direito da Autora" foi efectiva e ilegalmente restringido, pugnando pela "desaplicação" do despacho n.º 79/2005-XVII, de 16/04/05 do Sr. SEAF.
XXVII. O pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais formulado pela ora Autora, foi indeferido ". . . pela falta de verificação dos pressupostos quanto à sua concessão, em concreto pela inexistência de razões económicas válidas, determinados pelos n.º1 e 2 do artigo 69º do Código do IRC," e esse é o fundamento de direito que se encontra no despacho ora impugnado.
XXVIII. As referências que são feitas ao n.º4 do artigo 69° do mesmo código servem apenas como reforço da decisão do indeferimento, veja-se o ponto 15 da Adenda à informação n.º 1439/2006, que se transcreve: "E mesmo que se entendesse que a fusão tinha sido realizada por razões económicas válidas, a aplicação do plano específico de dedução dos prejuízos fiscais, a que alude o n.º4 do artº 69° do CIRC, não iria permitir que a entidade incorporante deduzisse os prejuízos da entidade incorporada".
XXIX. Assim, podemos concluir que a decisão de indeferimento foi devidamente fundamentada, na não existência de razões económicas válidas nos termos do n.º 1 e 2 do artigo 69º do CIRC, pelo que não tem a Autora razão quando pugna pela desaplicação da circular 7/2005.
XXX. Pelo supra exposto, deve manter-se a decisão de indeferimento por estar conforme à lei, mesmo que assim não se entenda, não pode ser procedente o pedido de condenação à prática de acto devido, tendo em conta que, o juízo discricionário da Administração só pode ser fiscalizado pelo Tribunal, quando exista erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal, o que não aconteceu.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. EXA., doutamente se dignará suprir, deve ser julgada procedente a excepção invocada, e no mais, deve a presente acção ser considerada inteiramente improcedente por não provada e pela não verificação de qualquer vício, mantendo-se o acto recorrido com todas as legais consequências.


Quanto à aceitação da competência deste Tribunal em razão da hierarquia para conhecer do mérito da presente acção, tendo em conta o disposto no art.º 38.º, alínea b) do ETAF, a mesma afigura-se-nos incontroversa, a qual assim, decididamente, se aceita.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se o despacho impugnado preencheu o conceito indeterminado de razões económicas válidas, em erro e, mesmo grosseiro; Se tais razões económicas válidas, no caso, se mostram preenchidas em ordem ao deferimento do pedido; E se tal despacho de indeferimento assentou em critério ex novo, fundado em Circular, sem acobertamento legal.


3. A matéria de facto.
Com relevo para a apreciação do mérito da acção, pelos documentos e processo administrativo juntos e articulação das partes, encontra-se provada a seguinte factualidade, a qual se passa a subordinar às seguintes alíneas:
a) Por requerimento entrado no Serviço de Finanças do Concelho de ………….. em 30.11.2005 e dirigido ao Exmo Ministro das Finanças, a C……….. ……………… de P..........., Cooperativa de Responsabilidade Limitada (ora autora), veio peticionar que se digne autorizar a transmissão, para si, entidade incorporante, dos prejuízos fiscais, no valor global de € 4.173.460, apurados no exercício de 2004 e no período compreendido entre 1/1/2005 e o dia da cessação da actividade da respectiva, pela C………. de ………. de Vila ……………, Cooperativa de Responsabilidade Limitada – cfr. processo instrutor, cujas folhas não se mostram numeradas;
b) No âmbito deste procedimento, uma técnica economista elaborou o parecer datado de 7.11.2006, onde propõe que tal autorização não seja concedida, por, além do mais e para o qual se remete, dada a sua extensão ...na medida em que, para além de não haver interesse económico conforme exige o n.º2 do artigo 69.º do CIRC, o plano específico de dedução de prejuízos fiscais transmitidos, que deverá ser efectuado ...não permitiria qualquer dedução dos prejuízos fiscais transmitidos pela CC……….. Com efeito, a alínea c) do n.º1 da Circular 7/2005, impõe como restrição à dedutibilidade dos prejuízos o contributo da sociedade incorporada na promoção dos resultados futuros da sociedade incorporante. Esse parâmetro é encontrado através do peso relativo que o património da sociedade incorporada possui, no conjunto dos patrimónios de todas as entidades envolvidas na operação.
Se, como um peso relativo próximo do zero (património quase nulo), a dedução fica limitada a uma reduzida percentagem do acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante, quando um património é negativo (o nosso exemplo), não será possível, face ao que está determinado, efectuar qualquer dedução dos prejuízos da incorporada na incorporante... - cfr. mesmo processo instrutor;
c) Sobre tal parecer foi ainda produzida uma ADENDA, datada de 14-12-2006, depois de exercido o direito de audição pela ora autora, onde foi aduzida doutrina no sentido da não autorização propugnada e tendo sido apreciados os fundamentos invocados em tal direito, rebatendo-os, tendo-se concluído: Somos de parecer que os argumentos aduzidos pela requerente no exercício do direito de audição não merecem acolhimento. Tendo em atenção a presente adenda e os factos e fundamentos invocados no projecto de decisão que se encontra no processo, propõe-se que se convole em definitivo o projecto de decisão ...- cfr. mesmo processo instrutor;
d) Sobre tal Adenda e parecer a Directora de Serviços apôs o seu despacho de Concordo, afigurando-se de convolar em definitiva a decisão de indeferimento do pedido de transmissão de prejuízos, com os fundamentos apresentados na informação e adenda, em 18-12-2006, bem como o substituto legal do Director-Geral, apôs o seu despacho de Concordo com o indeferimento, em 27.12.2006 – cfr. mesmo processo;
e) Sobre tais informações e despachos, foi lavrada a nota informativa, composta por duas folhas, procedendo ao resumo das razões para o indeferimento de tal transmissão de prejuízos, onde se propõe o consequente indeferimento, na qual o Exmo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, em 8.01.2007, apôs o seu despacho de Concordo, Despacho n.º 27/2007/XVII – cfr. mesmo processo;
f) O despacho supra foi notificado à ora autora pelo ofício 1236, datado de 17-01-2007 – cfr. mesmo processo;
g) A petição inicial da presente acção administrativa especial deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em 20.04.2007 – cfr. carimbo aposto a fls 2 dos presentes autos;
h) Pelas apresentações (provisórias por natureza), n.ºs 09/200050622 e 03/20051028, na Conservatória do Registo Comercial de P..........., foi inscrito o projecto de fusão, fusão e designação de órgãos sociais, da firma C……….. de ……………. de P..........., CRL, por transferência global do património da sociedade incorporada C……… de …………… de Vila …………., CRL,...para a sociedade incorporante, C……….. …………………. de P..........., CRL, por fusão por incorporação com alteração dos estatutos quanto ao objecto, capital mínimo e órgãos sociais...- cfr. mesmo processo.


4. O direito.
À hoje denominada acção administrativa especial correspondia o anterior recurso contencioso, que aquela veio substituir, tendo contudo o seu objecto sido ampliado, de molde a nela caber não só a declaração de invalidade ou anulação dos actos recorridos – cfr. art.ºs 6.º do anterior ETAF e 191.º do CPTA – como também, entre outros, no pedido de condenação à prática de um acto administrativo legalmente devido – art.º 46.º e segs do CPTA – e tendo o prazo geral para a sua dedução sido alargado para três meses – seu art.º 58.º - sendo esta, actualmente, a forma processual para fazer valer em juízo os direitos dos administrados que até então eram efectuados através do dito recurso contencioso.

A reforma sobre a tributação do rendimento e a adopção de medidas destinadas a combater a evasão e fraude fiscais constituiu o fundamento avançado pelo legislador para proceder a vastas e profundas alterações, quer no CIRS, quer no CIRC, na chamada reforma da tributação aprovada pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro.
Porém, volvidos que foram pouco mais de seis meses já, de novo, o legislador sentiu necessidade de rever, quer esses mesmos códigos, quer outros diplomas legais como o Estatuto dos Benefícios Fiscais, alteração agora erigida como instrumento de facilitação do conhecimento e interpretação do quadro legal por parte dos sujeitos passivos do imposto tendo procedido à sua republicação integral pelo Dec-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho.
Só que também aqui os propósitos do legislador nesta matéria não foram duradouros. Com efeito, volvido menos de um mês, já se encontrava de novo, a alterar, entre outros diplomas, o CIRC, em oito dos seus artigos pelo Dec-Lei n.º 221/2001, de 7 de Agosto.

Conforme consta do preâmbulo deste último Dec-Lei, as preocupações, agora, foram as de introduzir no regime de neutralidade fiscal no tratamento de operações que visam a reestruturação ou a racionalização da actividade das empresas, como forma decisiva para a competitividade do tecido empresarial, uma maior eficácia e celeridade. E como consta do mesmo preâmbulo, Dá-se a um dos aspectos fulcrais do regime – a transmissibilidade de prejuízos – maior desenvolvimento e prevê-se uma norma de deferimento tácito aplicável nas situações em que não seja proferida decisão no prazo de três meses contados a partir da data da apresentação do requerimento.

Por este último Dec-Lei, aplicável ao caso, tendo em conta a data em que o requerimento a pedir tais benefícios deu entrada na DGCI, a norma do art.º 69.º do CIRC, subordinada à epígrafe, Transmissibilidade dos prejuízos fiscais, tinha a seguinte redacção:
1 – Os prejuízos fiscais das sociedades fundidas podem ser deduzidos dos lucros tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante até ao fim do período referido no n.º1 do artigo 47.º, contado do exercício a que os mesmos se reportam, desde que seja concedida autorização pelo Ministro das Finanças, mediante requerimento dos interessados entregue na Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do mês seguinte ao do registo da fusão na conservatória do registo comercial.
2 – A concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos.
3 – O disposto nos números anteriores pode igualmente aplicar-se com as necessárias adaptações, às seguintes operações:
a)...
b)Na entrada de activos, em que é transferido para uma sociedade residente em território português um estabelecimento estável nele situado de uma sociedade residente num estado membro da união Europeia, que preencha as condições estabelecidas no artigo 3.º da Directiva n.º 90/434/CEE, de 23 de Julho, verificando-se em consequência dessa operação, a extinção do estabelecimento estável;
c)...
4 – No despacho de autorização pode ser fixado um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais a estabelecer o escalonamento da dedução durante o período em que pode ser efectuada e os limites que não podem ser excedidos em cada exercício.
...
7 – O requerimento referido no n.º1, quando acompanhado dos elementos previstos no n.º2, considera-se tacitamente deferido se a decisão não for proferida no prazo de três meses a contar da sua apresentação, sem prejuízo das disposições legais antiabuso eventualmente aplicáveis.
8 – Para efeitos do cômputo do prazo referido no número anterior, considera-se que o mesmo se suspende sempre que o procedimento estiver parado por motivo imputável ao requerente.
...
A norma daquele n.º7 veio ainda a ser objecto de nova alteração legislativa pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para o ano de 2003), tendo vindo alargar o prazo para se produzir o deferimento tácito para seis meses.

E a do art.º 47.º, esta na redacção vigente introduzida pelo citado Dec-Lei n.º 198/2001:
1 – Os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis exercícios posteriores.
...

No caso, o despacho do Exmo SEAF em causa, indeferiu, de forma expressa, o pedido da ora autora para esta deduzir no lucro tributável apurado no exercício da sua actividade, os prejuízos fiscais da sociedade em si incorporada, e teve lugar porque, além do mais ... na medida em que, para além de não haver interesse económico conforme exige o n.º2 do artigo 69.º do CIRC, o plano específico de dedução de prejuízos fiscais transmitidos, que deverá ser efectuado ...não permitiria qualquer dedução dos prejuízos fiscais transmitidos pela CCAMVNÇOS. Com efeito, a alínea c) do n.º1 da Circular 7/2005, impõe como restrição à dedutibilidade dos prejuízos o contributo da sociedade incorporada na promoção dos resultados futuros da sociedade incorporante. Esse parâmetro é encontrado através do peso relativo que o património da sociedade incorporada possui, no conjunto dos patrimónios de todas as entidades envolvidas na operação.
Se, como um peso relativo próximo do zero (património quase nulo), a dedução fica limitada a uma reduzida percentagem do acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante, quando um património é negativo (o nosso exemplo), não será possível, face ao que está determinado, efectuar qualquer dedução dos prejuízos da incorporada na incorporante..., ao que a ora autora contrapõe, que existe uma motivação económica nessa operação, desta forma pretendendo dar como preenchido o citado conceito legal de razões económicas válidas, sendo que tal erro em que a AT labora nesse preenchimento é mesmo grosseiro - conclusões 1.ª a 10.ª - e que tal despacho ao assumir como parâmetro de preenchimento desse conceito indeterminado o Despacho n.º 79/2005-XVII, de 2005/04/15, de S. Exa o SEAF, veio estribar a sua conformação legal com doutrina contida em fonte não legal, criando um verdadeiro critério decisório novo, em violação dos princípios da legalidade e da tributação pelo lucro real, já que tal Despacho não pode servir como parâmetro de conformação para o preenchimento desse conceito legal, antes o extravasando, o que também constitui uma sua ilegalidade – restantes conclusões recursivas da presente acção.

Relativamente à matéria das suas primeiras dez conclusões desta acção quanto o que teria sido o verdadeiro fundamento para indeferir a pretensão da ora autora, dos autos resulta, com suficiente clareza, desde logo da matéria da alínea b) do probatório firmado, que só por si, permite apreender que o foi por ausência de razões económicas válidas, estalão legal previsto no n.º2 do citado art.º 69.º do CIRC, que a AT entendeu e decidiu não se encontrar preenchido, sendo que a situação de património quase nulo da sociedade incorporada, como no caso acontecia, foi erigido pela AT como mais um factor coadjuvante ou acréscimo, para tal estalão se não encontrar preenchido, logo não podendo haver lugar à dedução dos pretendidos prejuízos da incorporada no apuramento da matéria colectável da incorporante, ainda que em tal despacho, segundo dele perpassa, pareça que se tenha ido mais longe, concretamente, quanto a tal dedução dos prejuízos, prospectando-o também, condicionalmente e no futuro.

É que na nota informativa referida na matéria da alínea e) do probatório supra fixado, nela se escreveu, ainda, “E mesmo que se entendesse que a fusão tinha sido realizada por razões económicas válidas, a aplicação do plano específico de dedução dos prejuízos fiscais, a que alude o n.º4 do art.º 69.º do CIRC, não iria permitir que a entidade incorporante deduzisse os prejuízos da entidade incorporada”, ou seja, ao menos em tese, o despacho recorrido admitiu, que mesmo com o preenchimento do estalão legal de razões económicas válidas, poderia, ainda assim, também não haver lugar à dedução de tais prejuízos, no todo, no caso, face ao citado n.º4 do art.º 69.º, que na realidade volta a colocar na AT o poder de, face à situação económico-financeira das entidades envolvidas na operação, designadamente dos respectivos patrimónios, da incorporada no caso, poder fixar os respectivos limites dessa dedução, pelo que embora tenha sido erigido aquele pressuposto legal como fundamento para o indeferimento desse pedido, ao se avançar mais uma razão para esse indeferimento, ao se convocar, no condicional, é porque se entendeu que a autora não reunia tais condições económicas válidas, desta forma se ficcionando que, mesmo que as reunisse, sempre o despacho seria o mesmo esteado num outro fundamento que a tal conduziria, não tendo directamente que ver com a invocação da Circular n.º 7/2005, cujo regime apenas foi avançado a título condicional e não para sobre ele estear o indeferimento desse despacho.

Aliás, em todo esse parecer de 7-11-2006, referido na matéria da alínea b) do probatório supra firmado, ressalta que o preenchimento desse conceito legal de razões económicas válidas era um dos requisitos legais que tinha de se mostrar preenchido para alcançar tal deferimento, como se pode ver desde logo de fls 4 desse relatório nos seus pontos 9., 10. e 11, a fls 7 no seu ponto 19 (a concessão da autorização da transmissibilidade dos prejuízos fiscais da incorporada na incorporante, está subjugada à evidência de que a fusão foi efectuada por critérios económicos vantajosos com consequências positivas na estrutura positiva ...), tendo concluído que “não se vislumbra qualquer efeito positivo na incorporação do património da CC……………… para a CCAMP..........., não contribuindo esse património para os resultados positivos futuros da requerente (sociedade incorporante)” e a fls 8., no seu ponto 21 (ainda que assim não fosse, em face da sociedade incorporada apresentar uma situação patrimonial negativa no último balanço apresentado antes da fusão, a aplicação do plano específico de dedução dos prejuízos fiscais, de acordo com o que estabelece o nº4 do artigo 69º do CIRC, conduz a um limite de dedução anual nulo), ainda que, o facto de a sociedade incorporada apresentar um património negativo parecer constituir também, um entre outros elementos relevantes para a AT considerar não preenchido esse conceito, reforçando esse não preenchimento que entendeu não verificado (como nesta parte bem se pronuncia a entidade demandada na matéria da sua conclusão XXVIII), não se vendo onde possa residir o erro pela AT no preenchimento desse estalão legal e muito menos que o mesmo seja grosseiro com a mesma o apelida na matéria da sua conclusão 10..

E o mesmo resulta da fundamentação da citada Adenda à informação n.º 1439/2006, onde foram analisados os fundamentos avançados pela ora autora em sede do direito de audição, com se vê de suas fls 4/6 e na referida nota informativa onde foi aposto o referido despacho que constitui o objecto desta acção e onde se conclui, além do mais, pela falta de verificação dos pressupostos quanto à sua concessão, em concreto pela inexistência de razões económicas válidas, determinados pelos n.º1 e 2 do artigo 69.º do Código do IRC ... pelo que mal se compreende que a ora autora venha querer erigir em fundamento do despacho aquilo que mais não foi um seu elemento integrador ao lado de outros, e através dos quais o mesmo despacho aquilatou que no caso não se encontrava preenchido o estalão legal de razões económicas válidas, pelo que não pode deixar de improceder a matéria destas conclusões do recurso.

Na matéria destas mesmas conclusões recursivas, pretende ainda a autora, que o tribunal sindique o bom uso efectuado pela AT quanto ao preenchimento deste conceito indeterminado legalmente consagrado de razões económicas válidas, que no caso, a mesma pretende que se mostram preenchidas, como da matéria das suas conclusões 4., 6. e 9. se pode retirar.

Na acção administrativa especial n.º25/04, de 1.2.2005, deste Tribunal(1), conheceu-se, sem limitações, se a aí requerente preenchia todos os requisitos para que lhe fosse deferida a requerida dedução dos prejuízos fiscais das referidas Sucursais a integrar nesta e a extinguir, que era o que estava em causa nessa mesma acção.

Porém, objecto de recurso para o STA, este mesmo Tribunal não veio a sufragar, nesta matéria, a posição aí seguida, antes veio a revogar o citado acórdão, pelo que será na senda do aí doutrinado e de outros acórdãos do mesmo Tribunal, entretanto prolatados, que iremos acompanhar, que a presente decisão terá lugar, tendo sobretudo presente, nos termos do disposto no art.º 8.º, n.º3, do Código Civil, que dispõe que o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito, para o que, especialmente, devem contribuir os tribunais de grau hierárquico inferior relativamente às decisões proferidas pelos tribunais de grau hierárquico superior, e também que, posteriormente, o aqui relator subscreveu, como 1.º adjunto, o acórdão deste TCAS de 15.7.2008, recurso n.º 2087/07, onde se seguiu esta mesma doutrina.

Como antes se viu, a concessão da autorização para a transmissão dos prejuízos fiscais, encontra-se dependente do preenchimento dos vários requisitos enunciados na norma do art.º 69.º n.º2 do CIRC, como seja a de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos, iniciando a norma pelo pano de fundo pretendido atingir pela fusão – razões económicas válidas – seguindo depois com um quadro exemplificativo onde é suposto apreender tais razões económicas válidas, como sejam nos casos de reestruturação ou racionalização, com efeitos positivos na estrutura produtiva, etc.
Este conceito de razões económicas válidas, tem assim de ser preenchido pela Administração, com os concretos elementos que tendam para aquele fim, concedendo à Administração um vastíssimo campo de concretização e de pesquisa tendo em vista preencher o estalão legal previsto em tal norma, mas ainda assim, havendo uma vinculação do administrador a um comportamento demarcado na lei, não existindo aqui quaisquer poderes administrativos discricionários, ao contrário do que parece afirmado pela entidade demandada na matéria das suas alegações.

Diferente, seria se o legislador tivesse optado por atribuir à Administração, entre os vários interesses aptos para a satisfação do interesse público, aquele que, no momento, melhor o satisfazesse, em que já lhe deixava nas mãos a escolha entre os vários comportamentos possíveis a adoptar, onde existiria a discricionariedade administrativa (2).

Como refere, Mário Esteves de Oliveira (3), também não temos dúvidas de que na interpretação da lei, não goza o intérprete – seja ele um juiz, um órgão administrativo ou a doutrina – de qualquer margem de livre escolha, tendo antes que procurar conhecer a mens legis e actuar na sua conformidade: o sentido a adoptar na interpretação é algo de profundamente diferente – senão contrário – da discricionariedade.
No poder discricionário qualquer dos comportamentos por que o agente opte é legal, enquanto que a interpretação só pode conduzir a um sentido ou comportamento – o que for querido pelo legislador ou pela lei.
...
Quando a lei administrativa, nomeadamente para a definição dos pressupostos da actividade administrativa, remete para conceitos técnicos próprios de outros ramos da ciência (Medicina, Química, Física, Engenharia, Economia, Sociologia, etc.), tem o órgão administrativo que recorrer aos ensinamentos destes para determinação do conteúdo da lei.
De facto, as questões resultantes da utilização de conceitos técnicos pela lei, resolvem-se através de critérios exclusivamente técnicos, não tendo o órgão administrativo a liberdade de repudiar o conteúdo que lhes é imputado nos respectivos ramos de ciência e optar por qualquer outro.

Como consta na matéria da alínea b) do probatório, além de outra constante nas informações em que o despacho impugnado se fundou, o fundamento por que foi indeferido o pedido de dedução de prejuízos fiscais, foi o de não preenchimento do pressuposto legal de razões económicas válidas, por entre outros elementos, a existência de património negativo da sociedade incorporada torna sem interesse a sua integração na sociedade incorporante e torna mais difícil a obtenção da reorganização e de obtenção de resultados positivos futuros nesta, o que só vai prejudicar a empresa incorporante (a ora autora), inexistindo preenchido, no caso, o pressuposto legal de interesse económico da fusão, não fazendo sentido aplicar-se-lhes o regime especial da neutralidade fiscal e a inerente transmissibilidade de prejuízos.

A sindicância de tal juízo de valor efectuado pela AT no citado despacho, de não se encontrar preenchido tal pressuposto legal de inexistência de razões económicas válidas para a incorporação, deve ser entendido nos termos da doutrina de, entre outros, do acórdão do STA de 12.7.2006, recurso 1003/05, no âmbito dos conceitos indeterminados em que nos encontramos, que a mesma AT cabe preencher.

"Sabendo nós que estamos perante conceitos indeterminados, como acima referimos, importa agora avançar no sentido de saber se, no caso, estamos perante um acto sindicável.

Escreve Freitas do Amaral que "o que importa é saber se a interpretação de conceitos indeterminados é uma actividade vinculada ou discricionária e, por conseguinte, sindicável, ou não, pelos tribunais - Curso de Direito Administrativo, vol. II, pág. 107.

Ora, saber se houve "razões económicas válidas" ou se a fusão "se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva" é matéria de discricionariedade técnica, com uma longa margem de livre apreciação da Administração, que poderá originar soluções diferentes, consoante o interesse que a Administração privilegie: uma fusão pode fundar-se numa razão económica válida para um interesse público de vitalidade da economia nacional, mas tal pode já não ocorrer em face dum interesse público de vitalidade de uma economia sectorial.

Citando Freitas do Amaral: "Porque não se lhe pede um trabalho de subsunção, uma tarefa declarativa de coincidência com um esquema dado, mas se exige uma tensão criadora do direito no caso concreto, deve naturalmente entender-se que esta actividade que, por desejo do legislador, sofre um influxo autónomo da vontade do agente-administrativo; deve escapar ao controlo do juiz, embora este tenha o dever de verificar se a solução encontrada obedeceu às exigências externas postas pela ordem jurídica".

"Assim sendo, e porque o acto de indeferimento do SEAF se fundamentou na inexistência dos requisitos exigidos pela lei para a concessão da autorização para deduzir os prejuízos fiscais acumulados pelas sociedades fundidas, este seu juízo não pode ser fiscalizado pelos tribunais.
A menos que ocorresse erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal. O que não se antolha (...).

Doutrina esta que também havia sido seguida no acórdão do mesmo STA de 5.7.2006, no recurso n.º 142/06, no sentido ora exposto, de que não cabe ao tribunal sobrepor à Administração o seu juízo na interpretação de tais conceitos técnicos e indeterminados, já que não nos encontramos no estrito campo da subsunção pelo intérprete do preenchimento dos conceitos jurídicos, a não ser perante a ocorrência de "erro grosseiro ou manifesto que é um erro crasso, palmar, ostensivo, que terá necessariamente de reflectir um evidente e grave desajustamento da decisão administrativa perante a situação concreta, em termos de merecer do ordenamento jurídico uma censura particular mesmo em áreas de actuação não vinculadas", como se refere no acórdão do mesmo STA de 11/05/2005, rec. 330/05, que no caso dos autos, tal espécie de erro, não aconteceu, igualmente improcedendo, nesta dimensão, a matéria destas conclusões.


Quanto à matéria das restantes conclusões 11. a 18., na medida em que a ora autora faz repousar o indeferimento desse indeferimento dos prejuízos fiscais em critério ex novo, do citado Despacho nº 79/2005/04/15, de S. Exa o SEAF, que o criara sem cobertura legal, na medida em que, como se viu, tal entendimento não correspondeu à realidade no caso, a acção não poderia deixar de improceder enquanto abrigada em fundamento que na realidade não teve lugar, visto que a invocação de tal Despacho o foi no condicional para, mesmo se preenchido o estalão legal de razões económicas válidas e outros legalmente fixados, houvesse deferimento do pedido, sempre a dedução dos prejuízos não poderia ter lugar, por força do disposto no n.º4 do mesmo art.º 69.º, que o citado Despacho visava interpretar com força vinculativa no âmbito da AT, como a lei lhe permite – cfr. art.º 68.º, n.º4, alínea b) da LGT (redacção de então) – como nesta matéria bem se pronuncia a entidade demandada, na matéria das suas conclusões XXII a XXVI, tendo apenas lugar a aplicação de tal norma deste n.º4, enquanto pressuposto autónomo, quando exista autorização para tal transmissibilidade desses prejuízos fiscais, só assim fazendo sentido que tal despacho os restrinja ou os escalone, que não quando ela seja denegada, o que a letra da norma desde logo não deixa dúvidas ao iniciar o seu texto por, “No despacho de autorização pode ser fixado um plano específico de dedução dos prejuízos ...”, em suma, constitui pressuposto para a emissão de despacho com os condicionalismos deste n.º4, quando se encontrem preenchidos os restantes e anteriores requisitos para o efeito, como seja o da existência de razões económicas válidas, conducentes ao deferimento do pedido, o que não foi o caso dos autos, pelo que a acção não poderia deixar de naufragar, enquanto esteada nesta invocada fundamentação da autora.


É assim de julgar improcedente na sua totalidade, a presente acção administrativa especial e de absolver dos pedidos a entidade demandada.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em julgar improcedente a presente acção administrativa especial e em manter o acto impugnado.


Custas pela autora, fixando-se a taxa de justiça em dez UCs e a procuradoria em 1/6 - art.ºs 73.º-D n.º3 e 41.º do CCJ.


Lisboa,11 de Dezembro de 2012
Eugénio Sequeira
Aníbal Ferraz
Pedro Vergueiro

Condenação à Prática de Acto Devido


Como sabemos, a figura da condenação à prática de actos administrativos insere-se nas acções administrativas especiais (art. 46º/ 2 a) CPTA) mas para podermos proceder à delimitação desta figura, cumpre distingui-la da impugnação de actos administrativos. Esta acção surge como meio para o particular recorrer de actos administrativos que apresentem vícios de ilegalidade para que, desta forma, esses actos possam ser declarados nulos, anulados ou inexistentes.

No entanto, se o particular não se bastar com a anulação pode ainda recorrer a outro tipo de acto para que a sua posição jurídica seja salvaguardada e regulada, estamos assim a falar da condenação à prática de acto devido.

Nos termos do artigo 66.º CPTA, são referidas duas modalidades de acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido:

a) Condenação à emissão de acto ilegalmente omitido;

b) Condenação à emissão de acto ilegalmente recusado de conteúdo favorável, em substituição do acto anterior desfavorável

Para que possa ser deduzido um pedido de condenação à prática de um acto administrativo, nos termos do art. 67º CPTA, é necessário que o interessado tenha começado por apresentar um requerimento que tenha constituído o órgão competentes no dever de decidir[1].

Cumpre então, antes de mais, explicitar o que se entende por acto devido.

Segundo o Professor Vieira de Andrade[2], o acto devido é aquele que devia ter sido emitido e não foi, quer tenha havido uma pura omissão, quer tenha sido praticado um acto que não satisfaça a sua pretensão.

No entanto, o Professor Vasco Pereira da Silva discorda desta posição afirmando que não se deve fazer tal valorização do pedido imediato sobre o pedido mediato e à causa de pedir. Para este autor, a causa de pedir deve também ser considerada, ou seja, é necessário ter uma concepção ampla do processo para que desta forma, o objecto seja a pretensão do interessado, ou melhor, o direito subjectivo do particular a uma determinada conduta da administração (e não o acto de indeferimento).

Esta posição também é defendida pelo Professor Mário Aroso de Almeida que acrescenta que “o processo de condenação não é configurado como um processo impugnatório, no sentido em que, mesmo quando tenha havido lugar á prática do acto devido o objecto do processo não se define por referência a esse acto ".

Em suma, o acto administrativo não possui qualquer autonomia, em caso de procedência do pedido do particular relativamente ao direito subjectivo lesado, ele é automaticamente eliminado.

O artigo 71.º CPTA demonstra, pois, que o que o tribunal aprecia verdadeiramente é a concreta relação administrativa entre o particular e a Administração, no intuito de apurar a existência ou não do direito do particular, e determinar o próprio conteúdo do acto devido.

Mas voltando ao regime legal, de acordo com o disposto no art. 67º/1 CPTA, a condenação à prática de actos administrativos pode ser pedida em três tipos de situações:

1)      Art. 67º/1 alínea a) – Aqui estamos perante casos em que a Administração tenha sido constituída no dever de decidir mas permaneceu omissa, não proferiu qualquer decisão até expirar o prazo legalmente estabelecido para decidir, incluindo-se aqui casos de incumprimento por parte da Administração.

Em caso de incumprimento do dever de decidir por parte da Administração passa, assim, a ser tratado como a omissão pura e simples, isto é, como um mero facto constitutivo do interesse em agir em juízo para obter uma decisão judicial de condenação à prática do acto ilegalmente omitido salvo, nos casos específicos em que a lei preveja deferimentos tácitos (art. 108º CPA);

 

2)      Art. 67º/1 alínea b) – Aqui cabem os casos em que a pretensão deduzida pelo interessado é indeferida através da recusa expressa do acto requerido. Sendo que aqui, o objecto do processo não é o acto de indeferimento mas sim a pretensão do interessado;

 

3)      Art. 67º/1 alínea c) – Aqui estão compreendidos os casos em que tenha sido recusada a apreciação do requerimento dirigido à prática do acto administrativo. Estando aqui compreendidas duas sub-hipóteses: o caso de a recusa poder ser contestada com fundamento na inexistência de facto dos motivos de ordem formal ou com falta de fundamento normativo.  

Estes requisitos baseiam-se no alcance subjectivista dado ao pedido, destinado à satisfação de direitos ou interesses legalmente protegidos do autor. Fora destas situações, o código permite também o pedido de condenação nos casos de inactividade oficiosa comprovada da Administração perante valores comunitários relevantes ou direitos dos particulares, bem como, embora em cumulação com o pedido impugnatório, as de indeferimento parcial ou indirecto da pretensão.

Por fim, é importante saber se todo e qualquer interessado pode pedir a condenação à prática de acto devido. O artigo 68.º CPTA refere as regras de legitimidade quando estão em causa pedidos de condenação, e neste caso, são partes legitimas para os apresentar:

- Sujeitos privados: os indivíduos e pessoas colectivas que aleguem a titularidade de um direito ou interesse legalmente admitido (artigo 68.º/1-a) e b) CPTA);

- Sujeitos públicos: as pessoas colectivas mas também órgãos administrativos, uma vez que embora o preceito não o preveja, os órgãos são os verdadeiros sujeitos públicos em direito administrativo e, por outro lado, o artigo 10.º/4 CPTA entende que os pedidos dirigidos aos órgãos devem ser considerados como dirigidos às pessoas colectivas, pelo que, tal como entende Vasco Pereira da Silva, não se vê qualquer sentido útil em admitir pedidos de condenação no domínio de relações inter-subjectivas e já não no âmbito das inter-orgânicas. Assim sendo, deve conjugar-se o art. 68.º/º1 b) com o art. 10º, dando prevalência a factores de ordem material sobre os de natureza formal.

- Ministério Público (actor público): actua na defesa da legalidade e do interesse público, somente quando decorra de um dever que resulte directamente da lei, pelo que só pode formular pedidos de condenação quando esteja em causa (art. 68º/1 alínea c)) a ofensa de um direito fundamental, de um interesse público especialmente relevante ou de qualquer bem referido no artigo 9.º/2 CPTA.



[1] ALMEIDA, M. AROSO DE, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2010, págs 316 e ss.
[2] ANDRADE, J. VIEIRA DE, Lições  de Direito Administrativo, 2010
 
AMARAL, D. Freitas do, Curso de Direito Administrativo, Almedina, 2007

BARBOSA, P., A Acção de Condenação no Acto Administrativo Legalmente Devido, AAFDL, 2007
 
SILVA, V. PEREIRA DA, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2009

Interesse Processual- breve nota


O interesse processual em sede de contencioso administrativo prende-se com a verificação objetiva de um interesse real e atual na tutela judicial, ou seja, em que termos o efeito útil a ser produzido na esfera jurídica da parte com a procedência do pedido justifica o recurso aos meios judiciais.

Este interesse não se confunde com o pressuposto da legitimidade como acontece, por exemplo, no processo civil. No contencioso administrativo, a legitimidade para figurar como parte no processo traduz-se na titularidade da posição jurídica substantiva, enquanto que o interesse exigido representa a verificação de uma situação concreta e objetiva que determine a necessidade de recorrer aos tribunais. Deste modo, entende-se que, no processo administrativo, uma parte pode ser interessada mas não ter interesse. Não obstante não se confundirem, o interesse processual, no entendimento do Prof. José Vieira de Andrade, complementa a legitimidade ativa, pois para efeitos de admissibilidade da pretensão, à titularidade da posição jurídica acresce a indispensabilidade de um efeito útil a ser produzido que seja digno de tutela jurisdicional. Isto percebe-se ao saber que, sendo o interesse processual decorrente do Princípio da economia processual, pretende-se que não sejam chamadas a juízo as partes de forma desnecessária e sem que a situação o justifique, bem como evitar sobrecarregamento dos tribunais com ações inúteis. 

Ainda que a regra determine o contrário, pois o CPTA não exige ao autor que faça demonstração da tentativa infrutífera de remoção do ato por via extra judicial, entende-se não haver interesse processual nas situações em que o mesmo recorre aos meios judiciais ignorando todo e qualquer meio de impugnação administrativa do ato, quando a lei exige o esgotamento dos mecanismos de impugnação administrativa antes do recurso à via judicial.

O interesse processual prende-se só, e tão só, com o interesse no acesso à justiça, pois havendo meios processuais adequados à obtenção de certos resultados, deixa de haver interesse na utilização de outros meios, nomeadamente os judiciais, seja em termos de efetividade de tutela seja em termos de economia processual. 


Olívia Afonso, n.º 19799