segunda-feira, 26 de novembro de 2012


Posições Subjectivas Procedimentais e Posições Substantivas de Fundo:

A Administração Pública tem a seu cargo a “prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”- artigo 266º nº1 da Constituição da República Portuguesa. No entanto, com o desenvolver de uma crescente diminuição da regulação do actuar Administrativo, e com um alargamento das faculdades de opção e ponderação na decisão face ao caso concreto atribuídas à própria Administração, torna-se mais sensível a problemática inerente à protecção das várias partes envolvidas no assunto, além de ser regular a discrepância de opiniões quanto à satisfação de interesses.

No procedimento administrativo podemos verificar a existência de uma dimensão objectiva como âmbito de detecção de soluções aos problemas concretos envolventes do interesse público, e uma dimensão subjectiva (de maior importância) com a intervenção necessária dos próprios interessados nas actuações que directamente os atingem – não sendo admitida a posição de mera sujeição por parte dos titulares das referidas posições substantivas, antes atribuindo-lhes a classificação de verdadeiros sujeitos intervenientes no procedimento administrativo - ou seja, reconhecimento das posições subjectivas procedimentais.

Devemos, antes de mais, e sob a orientação de Mário Aroso de Almeida, distinguir as posições substantivas de fundo que transmitem a posição em que se encontra o interveniente perante a Administração e que, por sua vez, legitimam as posições jurídicas subjectivas de natureza procedimental como posições de intervenção no procedimento administrativo.

As posições subjectivas procedimentais serão meramente instrumentais na medida em que não são directamente protectoras dos bens jurídicos, mas contribuem para a manutenção do apreço pelos mesmos contra eventuais agressões. Elas integram poderes e faculdades, deveres e sujeições que se reportam à actuação da Administração Pública – constituindo um poder de acção. Daí que, por regra, apenas podemos invocar a violação de eventuais posições subjectivas procedimentais quando vem a ser praticado um acto administrativo que ponha em causa uma posição substantiva de fundo.
Deve ser sublinhado que estas posições são verdadeiras posições jurídicas materiais na medida em que, também elas, concebem tutela dos interesses perante a Administração Pública, sendo então Direitos Procedimentais.

Como posições substantivas de fundo entendem-se os direitos e interesses legalmente protegidos. Em causa não está apenas a protecção do direito subjectivo assegurado pelo ordenamento como reconhecimento ao direito a um bem da vida, mas ainda as situações em que não sendo garantida a satisfação plena, o individuo apenas pode aspirar à sua satisfação – temos uma sujeição/pretensão perante o exercício de poderes discricionários por parte da Administração Pública, em que apenas se pode exigir por parte desta que exerça os seus poderes de acordo com a lei e princípios adequados à matéria.

Segundo Mário Aroso de Almeida, devem ser tratadas de forma diferente as actuações da Administração consoante se contraponham com posições subjectivas individuais de conteúdo opositivo do interessado - posições subjectivas procedimentalmente não conformadas -, as denominadas actuações administrativas agressivas; ou, consoante se dirijam a posições de conteúdo de mera pretensão - posições subjectivas procedimentalmente conformadas- por sua vez actuações ampliativas.

Nos procedimentos dirigidos à emissão de actos agressivos, contrapondo-se a posições subjectivas procedimentalmente não conformadas de conteúdo opositivo: verifica-se que o interessado age na protecção de um efectivo direito. É na medida em que os efeitos decorrentes da própria actuação administrativa se irão verificar na sua esfera jurídica que tal individuo aparece como interessado no procedimento administrativo. Emerge aqui, assim, uma actuação legítima de protecção do particular contra eventuais ameaças ao seu direito efectivo, inerentes ao próprio procedimento administrativo, exigindo-se a abstenção a perturbações ilegítimas – corresponde, segundo Mário Aroso de Almeida, a um direito à não emissão de actos ilegais ou à legalidade dos eventuais actos administrativos que venham a ser praticados.
Este direito à legalidade dos actos administrativos difere do direito efectivamente protegido – do direito substantivo de fundo -, mas será este direito à legalidade a configuração que a posição substantiva de fundo, ou seja, que a posição do detentor do direito substantivo de fundo, configura no próprio procedimento administrativo. Assim, o interessado apesar de ter como interesse material a não perturbação do direito substantivo, aparece no procedimento como mero detentor da posição substantiva de fundo que se traduz no direito à não emissão de actos ilegais. Esse interesse apenas existe enquanto situado no âmbito do procedimento e dentro das suas limitações. Fora do procedimento, no entanto, apresenta-se perante a Administração como titular de um direito subjectivo cuja satisfação passa pela não perturbação através intervenção administrativa.

Procedimentos ampliativos dirigidos à emissão de actos vantajosos correspondentes a posições subjectivas procedimentalmente conformadas de conteúdo pretensivo: Aqui ainda temos que distinguir a pretensão material, que se dirige a um acto administrativo constitutivo de determinado efeito jurídico favorável, onde se exige a satisfação da posição de fundo directamente perante quem está incumbido de a satisfazer; e pretensões instrumentais que se dirigem apenas à emissão de um acto jurídico que se pronuncie sobre a pretensão que terá natureza procedimental, correspondendo a um direito à acção dirigido a uma pronuncia de mérito sobre determinada questão. Não pode esta ser considerada uma verdadeira posição jurídica substantiva, na medida em que em causa esta meramente um direito a uma qualquer resposta ao pedido apresentado.
Na primeira modalidade, temos uma aproximação do anteriormente referido interesse à emissão de um acto administrativo em termos legalmente conformados (ponto acima exposto). Assim sendo, a sua relevância apenas decorre nas situações em que o acto favorável pretendido advém do exercício de poderes discricionários por parte da Administração. Uma vez que o conteúdo a adquirir não será exacto, não podemos talvez configurá-lo exactamente como um bem da vida protegido. Contudo, uma vez que haverá essa possibilidade, o direito reconhece a posição de interesse – daí que seja qualificado como interesse juridicamente protegido.


Nota Bibliográfica: Almeida, Mário Aroso; Manual de Processo Administrativo. Edições Almedina, Coimbra, 2010. Pp. 58 e 59. Almeida, Mário Aroso; Anulação de Actos Administrativos e Relações Jurídicas Emergentes, 2002. Pp. 125 e segs.

Marta Brito de Azevedo
Nº 18302

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