segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Tempestividade da acção de impugnação judicial do acto administrativo: Suspensão


A revisão constitucional de 1997 consagrou expressamente o direito à tutela jurisdicional efectiva dos administrados (artigo 268º nº4 e 5 da Constituição da República Portuguesa, doravante “CRP”).  Reconhece-se agora a possibilidade de impugnar judicialmente todos os actos praticados pela administração, basta para isso que o acto seja passível de lesar direitos e interesses legalmente protegidos (artigo 51º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante “CPTA”).
O principio da segurança jurídica autoriza, no entanto, que o direito dos particulares de acesso aos tribunais esteja condicionado à actuação do particular ou Ministério Público, num determinado período de tempo, evitando a continuidade de incertezas jurídicas quando à ilegalidade do acto. Há assim um outro requisito na acção de impugnação do acto administrativo, a tempestividade, previsto no artigo 58º do CPTA. É de notar que este artigo introduziu um ligeiro aumento dos prazos de impugnação, relativamente aos praticados no passado.
O artigo 58º CPTA estão previstas duas situações, uma primeira, no seu número primeiro, para os casos de declaração de nulidade do acto, ficando estabelecido que esses actos podem ser impugnados a todo o tempo, regra aliás que decorre do direito substantivo (artigo 134º nº2 do Código do Procedimento Administrativo, doravante “CPA”), uma vez que, a nulidade nunca é sanável. Uma segunda, no seu número segundo, para os casos de anulabilidade dos actos administrativos, fixando um prazo de 1 ano para o Ministério Público (artigo 58º nº1 alinea (a)do CPTA) e o prazo regra de 3 meses nos casos de impugnação fundado em anulabilidade, quando deduzida por particulares (artigo 58º nº2 alinea (b) do CPTA), sendo certo que o prazo anteriormente estabelecido era de 2 meses.
Uma das grande alterações introduzidas pela entrada em vigor do código foi o artigo 58º nº4 do CPTA, que prevê a possibilidade de alargamento do prazo de impugnação quando preenchidos um dos três pressupostos estabelecidos no artigo, taxativos:
1 – (a) – O interessado não impugnou porque a Administração o induziu em erro (exemplo: a Administração ter-se comprometido a revogar o acto);
2 – (b) – Um atraso desculpável do interessado;
3  - (c)  - Ter-se verificado uma situação de justo impedimento;
O artigo 7º do CPTA , nas palavras do professor Mário Aroso de Almeida “impõe ao juiz, em caso de dúvida, uma interpretação das normas processuais num sentido que favoreça a emissão de pronuncia sobre o mérito das pretensões formuladas”.
 O professor Vasco Pereira da Silva afirma que a introdução dos artigo 58º nº4 do CPTA, veio acabar com a velha história da convalidação do acto ilegal, em bom rigor o acto ilegal nunca se convalidava porque nunca deixava de ser ilegal, tendo sido agora alargado o prazo de impugnação. Além disso o artigo 38º do CPTA veio ainda dar a possibilidade ao particular de, apesar de ter passado o prazo, poder propor uma acção administrativa comum com vista à impugnação do acto.
O artigo 58º nº3 do CPTA estabelece o modo de contagem dos prazos referidos nos números anterior, remetendo o regime para as regras previstas no Código do Processo Civil. Deve-se ainda referir que o artigo 59º nº1 e 2 e 3 do CPTA determina o momento em que se inicia a contagem dos prazos de impugnação. Existem porém duas excepções a estas regras: a primeira vem estabelecida no artigo 59º nº4 do CPTA e a segunda no artigo 60º nº3 do CPTA, referindo este artigo que no caso de notificações deficientes de actos administrativos impugnáveis,” a apresentação, no prazo de 30 dias, de requerimento dirigido ao autor do acto, ao abrigo do disposto no número anterior, interrompe o prazo de impugnação, mantendo-se a interrupção se vier a ser pedida a intimidação judicial a que se refere o mesmo número”.
Questão importante vem abordada no artigo 59º nº4 do CPTA, dispõe este artigo que “a utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo”. Pretende-se assim valorizar e estimular a utilização das impugnações administrativas facultativas, bastando o preenchimento de dois requisitos: que a impugnação administrativa em causa seja legalmente admitida e que seja utilizada dentro do prazo legalmente estabelecido para o efeito. Verificados estes dois requisitos suspende-se o prazo de impugnação contenciosa, sem prejuízo do interessado poder prescindir desse efeito suspensivo e proceder à impugnação do acto na própria pendência de impugnação administrativa (artigo 59º nº5 do CPTA).
O artigo 59º nº4 do CPTA veio acabar com um problema administrativo gerador de lesões aos direitos dos particulares, passava-se o seguinte, durante um longo período de tempo, saber se o recurso hierárquico era necessário ou facultativo dependia da decisão do tribunal, e como não havia a regra de suspensão dos prazos, os particulares que punham a acção directamente sem recurso hierárquico podiam no final ver os seus direito lesados porque o tribunal decidia que naquele caso o recurso era obrigatório, tendo os particulares de interpor recurso hierárquico, sendo-lhe este negado, o prazo para interpor acção judicial já tinha passado, e o particular ficava sem meio para se defender. Por outro lado os particulares podiam interpor recurso hierárquico pensando ser necessário, era negado provimento ao recurso, ou por decisão expressa da administração ou por passagem dos 30 dias (artigo 165º e 175º do CPTA), findo o qual a impugnação administrativa se tem por tacitamente indeferida, e já tinha passado o prazo de impugnação contenciosa, ficando o particular novamente sem meio de defesa. Este panorama geral punha em causa os princípios da tutela jurisdicional efectiva e da segurança jurídica.  O artigo 59º nº4 do CPTA veio por fim a esta questão, no entanto, levanta ainda alguns problemas de aplicação:
- Em primeiro lugar coloca-se o problema de saber se o prazo se suspende quando o recurso hierárquico sofra de algum vicio (exemplo: falta de legitimidade), o que leva a que a administração não prenuncie uma decisão de mérito , em principio não se estava aqui no âmbito de aplicação ao artigo, no entanto o 59º nº4 do CPTA fala em suspensão do prazo de impugnação contenciosa aquando da utilização de meios de impugnação administrativa, independentemente do resultado que essa utilização vier a merecer, além disso uma decisão de rejeição de recurso ainda é uma decisão, sendo inclusivamente uma decisão impugnável. Logo até que seja proferida a decisão e que exista notificação da decisão proferida, há suspensão do prazo (Tiago Duarte e Claúdia Saavedra Pinto “A suspensão e a interrupção do prazo de impugnação judicial”).  A valer a interpretação contrária a utilidade que o legislador quis tirar da norma (maior utilização do recurso dentro da administração) seria corrompido neste aspecto, porque o particular podia vir a perder o prazo de impugnação contenciosa. (Em sentido contrário – STA 16-04-2008 (proc. 074307).
- Em segundo lugar coloca-se também o problema da inaplicabilidade da suspensão do prazo prevista no artigo 59º nº4 do CPTA em caso de impugnação administrativa indevida (posição defendida pelo acórdão acima referido). O professor Pedro Machete(“Notificação deficiente do acto administrativo”), defende que a haver erro desculpável, a perda do prazo de impugnação contenciosa poderia ser ultrapassada por recurso às alíneas (b) e (c) do nº4 do artigo 58º do CPTA. O professor Tiago Duarte afirma que “ a amplitude da suspensão do prazo de impugnação judicial dos actos administrativos promovida pela utilização (abusiva) dos meios de impugnação administrativa dependerá da maior ou menor diligência da administração, já que esta pode rejeitar o recurso ou reclamação, além disso o prazo que poderá obter a mais pela propositura de impugnação administrativa indevida é de 30 dias já que é o prazo legal para a decisão da administração (artigo 165º e 175º do CPTA), findo o qual a impugnação administrativa se tem por tacitamente indeferida.” O professor Paulo Ótero diz: “o projecto acaba por transformar a impugnação administrativa facultativa em impugnação recomendável: se o particular usar a via graciosa, a suspensão legal do prazo de impugnação contenciosa dos actos administrativos conferirá sempre ao recorrente um tempo suplementar de preparação da petição inicial, é o próprio processo que acaba por colocar nas mãos do recorrente a possibilidade de alargar o prazo de impugnação do acto administrativo”.
Soluções para os problemas criados no seio do artigo 59º nº4 do CPTA são:
1 – Maior diligência da Administração na apreciação das impugnações administrativas, rejeitando com rapidez aquelas que não preencham os requisitos que lhes permitam ser objecto de uma decisão de mérito que poderá reduzir a impugnação judicial;
2 – Deveria ser exigido que da notificação do acto contasse obrigatoriamente o órgão competente para apreciar o recurso hierarquizo;

Acórdãos relevantes nesta matéria :   
 1 – STA 08-06-2005 (PROCESSO: 0201/05)
2 – STA 06-10-2005 (PROCESSO: 0392/05) 
3 – STA 16-03-2006 (PROCESSO 0216/06)
4 – STA 16-05-2012 (PROCESSO 0212/12); 

Adriana Isaque nº19451

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